quarta-feira, 26 de julho de 2023

ARTIGO: CHAT GPT E A JURISDIÇÃO

Anísio Marinho Neto é professor e procurador de Justiça. Foto: Cedida


Não devemos compartilhar da opinião dos que, temerosos do arbítrio judiciário, procuram restringir ao máximo a liberdade do juiz. Tem-se presente a advertência de Henri de Page, que foi considerado um dos mais importantes advogados da Bélgica do século XX, de que nenhum magistrado há de cometer a insensatez de modificar, em nome da equidade, o limite da maioridade ou os prazos de prescrição. O alcance da equidade, dever estabelecido segundo a própria função teleológica do Direito, este não se exaure no conjunto de regras técnicas, destinado a disciplinar os fatos sociais, sem visar a um fim superior, a um objetivo mais alto que a solução imediata, empírica e material de um conflito de interesses.

Desafortunadamente, o Direito não é apenas isso. Se a tal ficasse reduzido, seria uma ciência sem grandeza. Através das Constituições e das leis, ele faz o regramento da vida coletiva, mas não abandona o homem à sua própria sorte, já que procura lançá-lo no caminho da perfeição, para organizar uma sociedade formada por seres melhores. Como essa é a autêntica missão do Juiz e como essa é a autêntica finalidade do Direito, de todo supérfluo é que prescrevam as Constituições e as leis que pode ou que deve o Juiz, em tal e qual situação, julgar por equidade. Não é necessário que a lei, seja constitucional, seja ordinária, indique a equidade como fonte formal do Direito, porque ela como regra de interpretação ou integração da norma, como inspiração ou como sentimento, está permanentemente na consciência do Juiz; não só na consciência, mas ainda no coração do Juiz.

Pode acontecer que, por efeito da evolução da consciência social, já não mais corresponda o receito legislativo a nenhuma finalidade humana merecedora de apreço, gerando-se uma antítese entre a lei e a Justiça, a justiça do caso concreto. Com a autorização do legislador ou sem ela, é invencível a forca da equidade, imanente ao sacerdócio julgador. A obra da Justiça não se subordina a critérios apriorísticos e jamais será suscetível de computação eletrônica ou do contemporâneo ChatGPT (chatbot online de inteligência artificial). Jamais se inventará uma máquina de conceber despachos, sentenças ou acórdãos, porque é e será a figura do juiz, agora e sempre, aqui e em toda parte, a inteligência criadora, a alma que vibra, o coração que palpita, a sensibilidade que reage. A equidade condiciona, por sem dúvida, a extraordinária sensibilidade da jurisprudência, a vitória do ideal da humanização do Direito, no sonho e na esperança de um dia mais feliz para a humanidade. Daí porque já constitui brocardo jurídico de que a lei reina, mas a jurisprudência governa.

Fonte: Novo Noticias


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