Desembargadores do RN serão alvo de processo disciplinar
Decisão é do Conselho Nacional de Justiça. Segundo corregedora Eliana Calmon, ex-presidentes do TJ participavam de esquema de fraude no pagamento de precatórios
Carolina Freitas
Plenário do Conselho Nacional de Justiça (Luiz Silveira/ Agência CNJ)
O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) decidiu nesta segunda-feira abrir processo administrativo disciplinar e afastar dois desembargadores do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte (TJ-RN), ex-presidentes da corte, por suspeita de fraude no pagamento de precatórios. A relatora do caso, corregedora nacional de Justiça, Eliana Calmon, sustentou que há provas contundentes da participação ativa dos juízes nas irregularidades. O procurador-geral da República, Roberto Gurgel, participou do julgamento e pronunciou-se favoravelmente à abertura do processo disciplinar e do afastamento. “Há indícios extremamente consistentes de peculato e formação de quadrilha com envolvimento dos desembargadores”, afirmou Gurgel. A sessão foi conduzida por Ayres Britto, presidente do CNJ e do Supremo Tribunal Federal (STF).
De acordo com Eliana Calmon, que baseou seu relatório nas investigações do Ministério Público do Rio Grande do Norte e de uma comissão especial do TJ do estado, a fraude acontecia por meio do uso de laranjas, da fabricação de processos falsos e de cheques, ordens de pagamento e depósitos feitos com a autorização da presidência do Tribunal durante a gestão dos desembargadores Osvaldo Soares Cruz e, posteriormente, de Rafael Godeiro Sobrinho. O esquema, segundo o CNJ, desviou ao menos 13 milhões de reais dos cofres públicos.
A corregedora de Justiça afirmou que as acusações estão baseadas em provas testemunhais e documentais. Os nomes dos desembargadores foram apontados durante investigação do MP, pela servidora Carla Ubarana de Araújo Leal, ex-chefe da Divisão de Precatórios do TJ e operadora do esquema. Protegida pelo mecanismo da delação premiada, Carla deu detalhes de como funcionava a fraude, uma ideia de Osvaldo Cruz, então presidente do TJ, segundo ela. De acordo com os relatos da servidora, foi ele quem a orientou a procurar laranjas para depositar o dinheiro que deveria servir para o pagamento de precatórios. Ela colocou à disposição então a conta de seu marido e de amigos próximos. Depois de algum tempo, eram feitos saques sucessivos e em valores inferiores a 100 000 reais no banco, para não levantar suspeitas.
A servidora afirmou que, em uma ocasião em que o grupo sacou 90 000 reais, 30 000 ficaram com ela e 60 000 com o desembargador Osvaldo Cruz. Quando ele deixou a presidência do TJ, indicou a seu sucessor, Godeiro Sobrinho, que mantivesse Carla no cargo. Godeiro logo passou a participar também do esquema, segundo as investigações. De acordo com Carla, nessa época, um terço do dinheiro desviado ficava com ela e o restante era repartido entre os desembargadores. Toda a liberação de depósitos e saques era feita por meio da assinatura dos desembargadores.
Sanha acusatória - A defesa dos juízes tentou responsabilizar apenas a servidora Carla Ubarana pelos desvios e levantou suspeitas sobre o fato de o nome dos desembargadores ter surgido apenas na delação de Carla. “Qualquer coisa serviria à sanha acusatória da delatora”, afirmou Armando Holanda Leite, advogado de Osvaldo Cruz. Ele disse ter laudo de um perito independente provando que em pelo menos dois cheques a assinatura de seu cliente tinha sido falsificada. O advogado de Godeiro Sobrinho, Bóris Marques Trindade, disse que Carla só acusara seu cliente por causa de uma inimizade entre as famílias dos dois. “Nunca vi balizar uma acusação desse tipo na palavra de uma delatora.”
As teses da defesa foram refutadas pela corregedora Eliana Calmon. “Não é possível que um desembargador não tenha a consciência de que não é um assinador de papel”, afirmou a ministra. “Não é admissível que o presidente de um tribunal justifique sua ação desprovida de qualquer zelo com base na confiança em uma servidora. Exige-se dos magistrados a prudência ao agir.”
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