terça-feira, 5 de maio de 2015

MINISTÉRIO PÚBLICO RECOMENDA PARALISAÇÃO IMEDIATA DAS OBRAS DA IGREJINHA DA PRAIA DE PIPA

Publicado no Diário Oficial do Estado a recomendação ministerial para que as obras da Igrejinha da Praia de Pipa fossem paralisadas imediatamente, acompanhe o seu teor:


MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE GOIANINHA



IC – Inquérito Civil nº 06.2015.00002620-4

RECOMENDAÇÃO Nº 0013/2015

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE, pela Promotora de Justiça Substituta abaixo assinada, no uso de suas atribuições legais, com fundamento no art. 127, caput, e art. 129 da CONSTITUIÇÃO FEDERAL e no art. 69, parágrafo único, alínea "d", da LEI COMPLEMENTAR ESTADUAL Nº 141/96, e

CONSIDERANDO incumbir ao Ministério Público a defesa da ordem jurídica, dos interesses sociais e individuais indisponíveis e de outros interesses difusos e coletivos, nos termos dos arts. 127, caput, e 129 da Constituição Federal;

CONSIDERANDO que cabe ao Ministério Público expedir Recomendações visando à defesa dos direitos assegurados nas Constituições Federal e Estadual;

CONSIDERANDO o disposto no artigo 216 da Constituição Federal, no sentido de que “constituem patrimônio cultural brasileiro os bens de natureza material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira, nos quais se incluem: I - as formas de expressão; II - os modos de criar, fazer e viver; III - as criações científicas, artísticas e tecnológicas; IV - as obras, objetos, documentos, edificações e demais espaços destinados às manifestações artístico-culturais; V - os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico, artístico, arqueológico, paleontológico, ecológico e científico”;

CONSIDERANDO que chegou ao conhecimento desta Promotora de Justiça que a Igreja de São Sebastião, situada no largo de mesmo nome, na praia de Pipa, Município de Tibau do Sul/RN, está sofrendo reformas/alterações, as quais, pelos indícios já reunidos nos autos, poderão descaracterizar a estrutura física do imóvel, que possui relevante valor histórico/cultural para a comunidade de Pipa, dada a história que envolve a sua construção e o significado que ostenta para a sociedade até os dias atuais;

CONSIDERANDO que, segundo o padre da paróquia, a obra sequer ainda dispõe de alvará da Prefeitura ou de um responsável técnico, malgrado tenha iniciado desde 09.04.2015;

CONSIDERANDO que nada impede que um bem tenha acentuado valor cultural, mesmo que ainda não reconhecido ou até mesmo se negado pelo administrador, de modo que eventual ausência de tombamento ou de outro modo de proteção especial conferida pela Administração ao aludido imóvel não é capaz de afastar o seu valor histórico/cultural, o qual pode ser reconhecido, inclusive, por meio de decisão judicial;

CONSIDERANDO que as obras têm provocado forte clamor público, consoante diversos comentários que circulam nesta Comarca, na imprensa e nas redes sociais, estando a população a se manifestar contrariamente às reformas já iniciadas;

CONSIDERANDO que, caso não sejam adotadas providências de imediato pelo Ministério Público, defensor dos valores mais caros à coletividade, a proteção que se busca dispensar ao referido bem poderá restar sem efeito, ocorrendo alterações substanciais ou mesmo a demolição integral do imóvel em tela;

CONSIDERANDO que não é razoável que se tolere a alteração/destruição de um bem para somente depois discutir o seu valor histórico/cultural, o qual, como sobredito, se não atestado pelo Poder Legislativo ou Executivo, pode ser reconhecido pelo Poder Judiciário, após as devidas apurações;

CONSIDERANDO que a jurisprudência não destoa desse entendimento, conforme julgado a seguir transcrito: “AÇÃO CIVIL PÚBLICA. TUTELA DE URGÊNCIA. PRESERVAÇÃO DE IMÓVEL. DEFESA DO PATRIMÔNIO HISTÓRICO, CULTURAL E ARTÍSTICO. LIMITAÇÃO AO DIREITO DE PROPRIEDADE. PREVALÊNCIA DO INTERESSE DA SOCIEDADE. RECURSO NÃOPROVIDO. A TUTELA DE URGÊNCIA É AMPARADA PELA NECESSIDADE DE PRESERVAR O BEM EM DISCUSSÃO, QUE VEM SENDO TRATADO COM DESCASO PELOS RECORRENTES. A DISCUSSÃO ACERCA DO VALOR ARTÍSTICO, CULTURAL OU HISTÓRICO DO IMÓVEL DEVE SER FEITA AO LONGO DO PROCESSO, O QUE SOMENTE PODERÁ OCORRER SE FOR MANTIDA A DECISÃO RECORRIDA, QUE CUIDOU DE RESGUARDAR A INTEGRIDADE DO BEM. POR OUTRO LADO, O DIREITO DE PROPRIEDADE DOS RECORRENTES PODE E DEVE SER LIMITADO QUANDO HÁ INTERESSE DA SOCIEDADE EM PROTEGER O PATRIMÔNIO ARTÍSTICO, CULTURAL OU HISTÓRICO. A TUTELA A ESTE PATRIMÔNIO É LEGITIMADA CONSTITUCIONALMENTE PELO ARTIGO 226 DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA, QUE ASSEGURA AO MINISTÉRIO PÚBLICO PROMOVER E PROTEGER O PATRIMÔNIO CULTURAL POR MEIO DE ACAUTELAMENTO E PRESERVAÇÃO. O FATO DE O IMÓVEL APRESENTAR RISCO DE DESABAMENTO NÃO AUTORIZA A REFORMA DA DECISÃO AGRAVADA, POIS É DEVER DOS RECORRENTES PRESERVÁ-LO, SOB PENA DE SEREM RESPONSABILIZADOS. ( AG. 1.0151.05.013641-6/001(1) – REL. DES. MARIA ELZA - J. 23/02/2006) grifos nossos;

RESOLVE:

RECOMENDAR ao proprietário e/ou responsável pelo imóvel que abriga a Igreja de São Sebastião, localizada no largo de mesmo nome, em Pipa, Tibau do Sul/RN que suspenda(m) imediatamente toda e qualquer obra/reforma que possa provocar alterações na estrutura física do imóvel, até que sejam concluídas as apurações relacionadas ao seu valor histórico/cultural, o qual poderá vir a ser reconhecido, inclusive, pelo Poder Judiciário do Estado do Rio Grande do Norte em razão da propositura de ação civil pública pelo Ministério Público.

Advirto que o descumprimento desta Recomendação acarretará a adoção das medidas cabíveis na seara cível e/ou criminal.

Encaminhe-se cópia deste documento ao CAOP do Meio Ambiente e ao Diário Oficial.

Goianinha/RN, 27 de abril de 2015.

Danielli Christine de Oliveira Gomes Pereira
Promotora de Justiça Substituta

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